Por Wladimir Safatle
O ministro da Fazenda, Guido
Mantega, afirmou nos últimos dias que a elevação dos gastos com a educação ao
patamar de 10% do Orçamento nacional poderia quebrar o País. Sua colocação vem
em má hora. Ele deveria dizer, ao contrário, que a perpetuação dos gastos em
educação no nível atual quebrará a Nação.
Neste exato momento, o Brasil
assiste a praticamente todas as universidades federais em greve. Uma greve que
não pede apenas melhores salários para o quadro de professores e funcionários,
mas investimentos mais rápidos em infraestrutura. Com a expansão do ensino
universitário federal, as demandas de recurso serão cada vez mais crescentes e
necessárias. Isto se quisermos ficar apenas no âmbito das universidades
públicas.
Por trás de declarações como as do
ministro, esconde-se a incompreensão do que é o próximo desafio do
desenvolvimento nacional. Se o Brasil quiser oferecer educação pública e de
qualidade para todos precisará investir mais do que até agora foi feito.
Precisamos resolver, ao mesmo tempo, problemas do século XIX (como o
analfabetismo e o subletrismo) e problemas do século XXI (como subvenção para
laboratórios universitários de pesquisa e internacionalização de sua produção
acadêmica). Por isto, nada adianta querer comparar o nível de gasto do Brasil
com o de países com sistema educacional consolidado como Alemanha, França e
outros. Os desafios brasileiros são mais complexos e onerosos.
O investimento em educação é, além
de socialmente importante, economicamente decisivo. O governo ainda não
compreendeu que o gasto das famílias com educação privada é um dos maiores
freios para o desenvolvimento econômico. Vivemos em um momento no qual fica
cada vez mais clara a necessidade de repactuação salarial brasileira. A maioria
brutal dos empregos gerados nesses últimos anos oferece até um salário mínimo e
meio. A proliferação de greves neste ano apenas indica a consciência de que
tais salários não podem garantir uma vida digna com possibilidade de ascensão
social.
Há duas maneiras de aumentar a
capacidade de compra dos salários: aumento direto de renda ou eliminação de
custos. Nesse último quesito, os custos familiares com educação privada são
decisivos. A criação de um verdadeiro sistema público de educação seria o maior
aumento direto de salário que teríamos.
O governo teima, no entanto, em
não perceber que o modelo de desenvolvimento conhecido como “lulismo” está se
esgotando. Lula notou que havia margem de distribuição de renda no Brasil sem a
necessidade de acirrar, de maneira profunda, conflitos de classe. De fato, sua
intuição demonstrou-se correta. Mas o sucesso momentâneo tende a cegar o
governo para os limites do modelo.
Com a ascensão social da nova
classe média, as exigências das famílias aumentaram. Elas querem agora fornecer
aos filhos condições para continuar o processo de ascensão, o que atualmente
passa por gastos em escola privada. Esses gastos corroem os salários, além de
pagar serviços de baixa qualidade. A escola brasileira, além de cara comparada
a qualquer padrão mundial, é ruim.
É fato que o aumento exponencial
dos gastos em educação coloca em questão o problema do financiamento do Estado.
Ele poderia ser resolvido se o governo tivesse condição política para impor uma
reforma tributária capaz de taxar grandes fortunas, transações financeiras,
heranças e o consumo conspícuo para financiar a educação. Lembremos que, com o
fim da CPMF, o sistema de saúde brasileiro viu postergado para sempre seus
sonhos de melhora.
Tais condições exigiriam um tipo
de política que está fora do espectro do lulismo, com suas alianças políticas
imobilizadoras e sua tendência em não acirrar conflitos de classe. O Brasil
paulatinamente compreende a necessidade de passar a outra etapa e, infelizmente,
poucos são os atores políticos dispostos a isto.
Fonte:
http://www.cartacapital.com.br/politica/o-que-quebrara-o-pais/?autor=961
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